Os modelos de negócios de impacto e cooperativismo compartilham princípios essenciais, como sustentabilidade, governança responsável e impacto social positivo. No entanto, cada um desses formatos possui características específicas que podem servir de inspiração para o outro, impulsionando transformações mais profundas no mercado. Mas quais são os aprendizados possíveis entre esses modelos?
Para responder a essa questão, os especialistas Maria Flávia Bastos, professora, escritora e pesquisadora de gestão social e negócios sustentáveis, e Estevan Sartoreli, cofundador da Dengo Chocolates e expert em ESG e impacto social no Brasil, analisam como o cooperativismo e os negócios de impacto podem aprender um com o outro para fortalecer suas práticas e ampliar a transformação social e econômica.
Negócios de impacto: o que são e como se relacionam com o cooperativismo
Para compreender como negócios de impacto e cooperativismo podem aprender um com o outro, é preciso compreender o que define esse modelo de empresa. De acordo com a Aliança pelo Impacto, negócios de impacto são empreendimentos que buscam solucionar problemas socioambientais de forma intencional, mantendo sustentabilidade financeira e medindo o impacto gerado. Esses negócios operam dentro da lógica de mercado, mas têm compromisso explícito com a transformação social e ambiental.
Embora sejam modelos distintos, cooperativas e negócios de impacto compartilham princípios essenciais. Ambos buscam equilibrar crescimento econômico com impacto social e sustentável, mas estruturam suas operações de formas diferentes.
“O cooperativismo, por essência, já promove impacto social e sustentável. Ele tem princípios estruturais que o aproximam dos negócios de impacto, principalmente no que diz respeito à sustentabilidade econômica e ao fortalecimento das comunidades”, explica Maria Flávia Bastos.
Governança participativa como diferencial
A estrutura de governança é uma das grandes diferenças entre cooperativas e negócios de impacto. Cooperativas têm gestão horizontal obrigatória, com tomada de decisão compartilhada entre os cooperados. Já os negócios de impacto, mesmo adotando princípios de sustentabilidade, geralmente seguem uma governança mais tradicional, com hierarquias bem definidas.
Para Maria Flávia Bastos, essa diferença pode ser uma oportunidade de aprendizado para ambos os lados. “Nas cooperativas, a gestão participativa é um princípio fundamental, o que possibilita um ambiente de diálogo e crescimento conforme as demandas dos stakeholders. Nos negócios de impacto, a governança segue a lógica do mercado, mas em muitos casos também adota um modelo de gestão social”, analisa.
Por outro lado, o cooperativismo também pode absorver práticas do setor de negócios de impacto, especialmente em inovação e estruturação estratégica. Segundo Estevan Sartoreli, “negócios de impacto social buscam promover renda digna para pequenos e médios produtores, conservar a natureza e oferecer produtos mais saudáveis. Assim como no cooperativismo, princípios como colaboração, valor compartilhado, transparência e respeito ao produtor estão na base desses modelos”, explica.
Intercooperação: um modelo que pode ser expandido
O cooperativismo se baseia na intercooperação, ou seja, na colaboração entre cooperativas para fortalecer o setor como um todo. Esse conceito poderia ser aplicado também ao ecossistema dos negócios de impacto, ampliando sua influência e potencial de crescimento.
“Um dos princípios que mais admiro no cooperativismo é a intercooperação, onde cooperativas colaboram localmente, regionalmente e internacionalmente. Esse princípio poderia ser adotado por empresas sustentáveis e negócios de impacto, criando redes de conhecimento e soluções compartilhadas”, defende Maria Flávia Bastos.
Sustentabilidade integrada ao core business
Outro ponto essencial de aprendizado entre os modelos está na forma como a sustentabilidade é incorporada à estratégia de negócios. Para Estevan Sartoreli, a sustentação econômica e ambiental só faz sentido quando está totalmente alinhada ao core business da empresa.
“Há quase meio século, o termo sustentabilidade foi cunhado, mas muitas empresas ainda enxergam sustentabilidade e lucro como opostos. Quando a sustentabilidade está no centro do negócio, ela se torna um investimento, não um custo. Isso é algo que tanto cooperativas quanto negócios de impacto podem reforçar para gerar rentabilidade e longevidade”, argumenta Sartoreli.
Comunicação e educação do mercado
Ambos os especialistas destacam que um dos desafios mais críticos para os dois modelos é educar o mercado e os consumidores sobre seu impacto. Para Maria Flávia, muitas pessoas desconhecem como o cooperativismo funciona e, por isso, não consideram essa alternativa ao criar um negócio ou tomar decisões de consumo.
Já Estevan Sartoreli enfatiza que o grande problema dos negócios sustentáveis é a percepção errada do consumidor. “Precisamos educar consumidores e sociedade sobre o modelo de abundância insustentável em que estamos inseridos. Se não ajustarmos esse equilíbrio, negócios que não souberem integrar impacto e economia correm o risco de desaparecer”, alerta Sartoreli.
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