Uma pesquisa recente do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) mostrou que, nos últimos cinco anos, algumas modalidades de planos coletivos tiveram reajuste quase duas vezes maior que o percentual estipulado pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) para os contratos individuais e familiares.
Enquanto o preço médio das mensalidades de planos de saúde individuais, contratados para a faixa etária de 39 a 44 anos, passou de R$ 522,55 em 2017 para R$ 707,59 em 2022, os coletivos empresariais contratados para grupos com até 29 pessoas subiram de R$ 539,83 para R$ 984,44. Ou seja, a variação nos contratos coletivos foi de 82,33%, já a dos individuais foi de 35,41% no mesmo período.
O professor da pós-graduação em Direito Médico e Hospitalar da USP de Ribeirão Preto, Elton Fernandes, que também é advogado especialista em ações contra planos de saúde, explica que isto ocorre porque os contratos empresariais e coletivos não têm os reajustes regulados pela ANS. Como consequência, as operadoras de saúde costumam aplicar aumentos muito superiores aos praticados pela agência reguladora.
“As empresas costumam ofertar os planos coletivos com um preço de entrada menor porque sabem que, no longo prazo, ganharão muito mais dinheiro com os reajustes que, em alguns casos, chegam a ser o triplo do que é aplicado pela ANS nos contratos individuais e familiares no mesmo período”, relata Elton Fernandes.
Reajuste dos planos coletivos
A pesquisa do Idec mostrou, por exemplo, que os planos coletivos por adesão tinham, em 2017, preço médio (R$ 485,03) inferior ao dos individuais. Porém, esse valor subiu consideravelmente, passando para R$ 845,53 em 2022 para os contratos de até 29 pessoas, um aumento de 74,33%. No mesmo período, o reajuste dos planos individuais foi de 35,41%.
“Por isso, sempre que for contratar um plano de saúde, veja se existe um plano individual ou familiar na sua região. Porque, apesar de o plano coletivo ser mais barato na contratação, no longo prazo tende a ficar mais caro”, ressalta o advogado Elton Fernandes.
Em nota, a coordenadora do programa de saúde do Idec, Ana Carolina Navarrete, classificou os planos coletivos como armadilhas para os consumidores, que acreditam estar fazendo um bom negócio com base no valor da contratação, mas são surpreendidos com os reajustes maiores. “Com grande disponibilidade, ao contrário da oferta cada vez mais reduzida dos planos individuais, os coletivos dominam o mercado e acabam se tornando uma bomba-relógio que, ao longo do tempo, vai aumentando a chance de explodir”, avaliou.
Os planos de saúde individuais e familiares, hoje, respondem por 8 milhões de beneficiários. Já os contratos coletivos empresariais e por adesão abarcam a maioria dos usuários de planos de saúde, cerca de 42 milhões.
Regulação da ANS para os planos coletivos
A ANS, por sua vez, regula apenas os reajustes dos planos individuais e familiares, cujo percentual ficou em 9,63% em 2023. De acordo com a agência, o cálculo para determinar o índice leva em consideração a variação das despesas médicas de um ano para outro, apuradas nas demonstrações contábeis das operadoras e em um índice de inflação.
Já no caso dos planos coletivos, a ANS instituiu o agrupamento de contratos para as apólices com até 29 vidas, em que as operadoras devem aplicar o mesmo percentual de reajuste. Para os contratos com mais de 30 vidas, há a livre negociação entre a administradora do plano de saúde e a pessoa jurídica contratante. A variação na mensalidade dos planos de saúde pode ser acompanhada no painel de Reajustes da ANS.
O advogado Elton Fernandes lembra, porém, que se a operadora de saúde impõe um reajuste muito alto, sem qualquer justificativa técnica para a cobrança, o beneficiário pode recorrer à Justiça para reverter o aumento indevido.
“Embora a ANS não regule os reajustes dos planos empresariais e coletivos por adesão, é possível buscar, em várias situações, a aplicação do índice da ANS em substituição ao percentual aplicado pela operadora”, explica o advogado.
Mudança na legislação dos planos de saúde
A regulação dos reajustes de planos coletivos, porém, pode tornar-se realidade caso o Projeto de Lei 7419/2006 seja aprovado pela Câmara dos Deputados. O PL prevê, entre outras mudanças na Lei dos Planos de Saúde (9656/98), a imposição de um limite para o reajuste dos planos coletivos.
Em discussão na Câmara dos Deputados há 17 anos, o projeto voltou à pauta recentemente e, segundo o novo relator, o deputado Duarte Jr. (PSB-MA), o texto substitutivo passou por todas as comissões e deve avançar neste segundo semestre.
“A proposta que está sendo debatida no Congresso coloca sob a responsabilidade da ANS, inclusive, o reajuste dos planos de saúde PME e coletivos por adesão, o que sofre resistência por parte das operadoras e não será fácil passar, considerando que o legislativo atual tem um viés mais liberal. Contudo, é essencial que haja mecanismos de transparência desse reajuste, pois 80% dos planos de saúde atuais são de natureza coletiva”, analisa o advogado.
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