O medo da morte é poderoso. As pessoas tudo fazem para amenizá-lo. Umas envolvem-se com pessoas mais jovens. Outras têm crises de meia idade. Há aquelas que ficam obsessivas com plásticas ou ginástica. Outras pretendem continuar a viver por intermédio dos filhos ou de suas obras.
Tão obcecadas ficam com a ideia de morrer, que esquecem de viver a vida. Preocupam-se com o inevitável. Não percebem que a idade pouco importa: a cada dia que passa estão mais perto da morte.
A vida é uma sequência de acontecimentos que se encerra com ela. Embora a vida termine o tempo vivido não se apaga. Ninguém sabe o que é a morte. Supomos que é o maior de todos os males e que os mortos têm uma grande recompensa: não morrer nunca mais.
Sócrates, contudo, ao ser defrontado com a condenação que lhe fora imposta não se incomodou. Ao ouvir de seu juiz que estava condenado a morte, prontamente respondeu: o senhor também. E indagou diante de todos que acompanhavam o seu julgamento se o que estaria prestes a lhe acontecer não seria um bem.
Julgava que havia três opções. A primeira é que morrer seria igual a nada e se essa fosse a opção correta, não haveria porque temer, pois não haveria sensação alguma. A segunda é que morrer seria como um sono eterno no qual o adormecido nada vê nem sonha. Nesse caso julgava ser uma vantagem maravilhosa, pois toda a duração do tempo nada mais seria do que uma noite. Finalmente considerava que poderia ser uma mudança de planos de existência. Aqui também só via benefícios e imaginava poder se encontrar com os grandes filósofos, estadistas, entes queridos e amigos já falecidos.
Certamente quem lê esse tipo de argumentação pensa que se trata de coisa de filósofo. Na verdade acho que Sócrates percebeu que morria no momento certo. Viveu enquanto viveu e após viver plenamente perdeu o terror pela morte. O medo some quando a vida foi amplamente consumida.
Sócrates viveu a vida, não foi vivido por ela. Foi ele quem a escolheu, não foi por ela escolhido. Amou cada instante porque cada um deles foi por ele querido. Recusou-se a lamentar pelas coisas que não fez e tendo vivido plenamente concordou em morrer apesar de ter a possibilidade de escapar ao seu destino.
É essa a lição que devemos extrair. A ansiedade que bate no peito do homem moderno é porque o coração está explodindo por toda a vida não vivida. Cada batida marca o tempo que se vai. O tempo é ávido. Devora a vida sem nada dar em troca, a não ser a angústia pelo que não fizemos. Sofremos ao encarar o inevitável, porque passamos a vida inteira seguindo os papéis que nos foram impostos sem jamais reivindicar a liberdade.
Ser livre faz o homem perceber que mesmo na velhice, quando a morte se aproxima, não é com ela que o ser humano se relaciona. A ideia de aproximação da morte é errada. Todo homem se relaciona com a vida até o fim.